Todos os direitos reservados @ Fausto Castelhano, "Retalhos de Bem-Fica" (2014)
Capítulo III - O renascer da Quinta de Montalegre
(por Fausto Castelhano **)
Oriundo da região de Aveiro, Augusto Rodrigues Castelhano nasceu no dia 2 de Setembro de 1892 na aprazível Freguesia de Salreu, Concelho de Estarreja, precisamente no povoado das Pedreiras, lugarejo sobranceiro ao fértil vale do rio Antuã por onde o curso de água serpenteia ladeado, ora por frondosas matas de pinheiros, carvalhos e eucaliptos, ora pelas fecundas várzeas de aluvião das suas margens, perfazendo a distancia aproximada de 38 Km desde a sua nascente em S. Marcos, lugar da freguesia de Fajões (concelho de Oliveira de Azeméis) até desaguar na formosa Ria de Aveiro.
O rio Antuã frente ao Tribunal de Estarreja.
(Óleo de J. Mendonça - Foto Wikipédia)
Cobrindo extensa e fértil bacia hidrográfica de 149,2 Km2, a foz do rio Antuã encontra-se localizada a sudoeste da cidade de Estarreja depois de atravessar os concelhos de Oliveira de Azeméis, S. João da Madeira e Estarreja.
O lugarejo das Pedreiras onde Augusto Castelhano viu pela primeira vez a luz do dia, fica um pouco à ilharga da acolhedora “Praia dos Tesos”, junto à turbina e ao açude que se assumia como admirável praia fluvial de águas límpidas, local pitoresco e bastante concorrido pela população das redondezas, graças à quietude ambiental do espaço envolvente e onde sobressaíam as sementeiras de regadio (milho e feijão, batata e leguminosas) por entre os renques de choupos e salgueiros, árvores de fruto ou latadas das odoríferas uvas “morangueiras” (“americanas”) compondo assim, um cenário verdadeiramente encantador.
A “Praia dos tesos” e a turbina no Rio Antuã. Imagem dos anos 90 do século XX
(Foto Wikipédia)
A um nível inferior em relação ao açude e na própria correnteza do rio Antuã, avultava o utilíssimo lavadouro natural das comunidades limítrofes. Também denominada Praia dos Pobres, Praia da Turbina ou simplesmente Turbina, nome que lhe advém de antiga represa para aproveitamento hidroeléctrico do rio Antuã e que actualmente se encontra abandonada. Outrora, a energia gerada através de uma turbina fornecia electricidade à Quinta da Costa (“Casa dos Marques Rodrigues”), iluminava ruas da freguesia de Salreu e alimentava a maquinaria da Fábrica de Descasque de Arroz localizada perto da Estação da CP de Estarreja.
Filho mais novo de modestíssimos agricultores (Francisco Rodrigues Castelhano e Margarida Duarte), Augusto Castelhano logo que perfez 15 anos de idade e depois do final das colheitas em Setembro de 1907, abalou da terra natal e demandou a cidade de Lisboa tendo por meta principal, granjear muito melhores condições económicas que lhes estariam vedadas na sua terra natal.
Augusto Rodrigues Castelhano na cidade de Lisboa em 1912.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Augusto Castelhano será acolhido por dois irmãos mais velhos e já residentes na capital alfacinha desde há alguns anos, a irmã Palmira Rodrigues Castelhano, comerciante de frutas e hortaliças, moradora em Palma de Baixo, próximo na junção da Estrada das Laranjeiras e da Estrada da Luz e Manuel Rodrigues Castelhano que se lançara à vida com uma venda de leite ao domicílio na cidade de Lisboa. Residia, então, na Quinta do Fole (também conhecida por Quinta do Paraíso) localizada na antiga Estrada de Sacavém, nº183, Freguesia de Arroios, Concelho de Lisboa e onde Augusto Castelhano fixará, doravante, residência na companhia do mano mais velho.
Manuel Rodrigues Castelhano em 1940, irmão mais velho de Augusto Castelhano e que o acolheu na Quinta do Fole (antiga Estrada de Sacavém, 183) quando demandou a cidade de Lisboa.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Augusto Castelhano terá oportunidade de assistir às extraordinárias movimentações políticas num país em permanente convulsão que conduziram, tanto ao Regicídio (2 de Fevereiro de 1908), como pouco tempo depois, às ocorrências que levaram à implantação da República Portuguesa (5 de Outubro de 1910), eventos que descrevia com evidente entusiasmo e dos quais guardava indeléveis recordações.
Amiúde e aos serões, deliciando-se com uma caneta de café quente e o inevitável cheirinho de bagaceira, prendia-nos a atenção quando imbuído de indisfarçável deleite narrava, guarnecendo com todos os pormenores, tantas peripécias surpreendentes ocorridas durante o espaço de alguns anos da sua existência e que tinham a virtude de nos encantar de modo absoluto.
Ao atingir a maioridade (21 anos) em 1913, Augusto Castelhano vai apresentar-se “às sortes” na Inspecção Militar e, depois de apurado para todo o serviço militar, assentará “praça” no Exército Português e será incorporado na arma de Infantaria.
Palmira Rodrigues Castelhano, irmã de Augusto Rodrigues Castelhano. Foto com dedicatória: “Lisboa, 4 de Novembro de 1928-Ofereço este meu retrato ao meu querido irmão Augusto para que nunca mais se esqueça desta que te quer bem”.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Entretanto e devido a motivos extremamente complexos, mas cuja causa imediata aponta para o assassinato em Sarajevo de Francisco Ferdinando (Arquiduque do Império Austro-Húngaro) pelo sérvio nacionalista Gavrillo Princip, rebenta a chamada 1ª Guerra Mundial, exactamente no dia 28 de Junho de 1914. O conflito vai envolver as grandes potências de todo o mundo, as quais se vão organizar em dois blocos opostos: a Tríplice Entente (França, Inglaterra e Rússia) e a Tríplice Aliança (Império Alemão, Império Austro-húngaro e a Itália.
Em Portugal vão confrontar-se duas tendências antagónicas que se digladiam mutuamente: contra a guerra (Republicanos, Unionistas de Brito camacho, Clericais, Anarco-sindicalistas e Monárquicos) e a favor da participação activa no conflito (Democráticos, partidários de Afonso Costa).
Augusto Rodrigues Castelhano em 2 de Março de 1914 quando já se encontrava incorporado na arma de Infantaria do Exército Português.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Porém, já em 11 de Setembro de 1914 e sob o comando do coronel Alves Roçadas, um corpo expedicionário de 1.500 homens embarca a caminho de Angola, tal como uma expedição militar será enviada para Moçambique, comandada por Pedro Massano de Amorim, no intuito de defenderem as possessões coloniais dos ataques das forças germânicas. Não obstante, a 31 de Outubro de 1914, a guarnição militar portuguesa em Cuanza (Angola), é massacrada por soldados alemães, agravando a situação portuguesa na fronteira com a colónia alemã (actual Namíbia).
Entretanto e tendo por finalidade conferenciar com o Estado-Maior britânico e preparar a eventual entrada de Portugal na guerra, uma missão portuguesa composta pelos capitães Ivens Ferraz, Fernando Freiria e Azambuja Marina, desloca-se a Londres a 18 de Outubro de 1914.
A 30 de Dezembro de 1915 e em nome da “Aliança luso-britânica”, o Foreign Office, consulta o governo português sobre a possibilidade de requisitar os navios alemães surtos nos portos nacionais, tanto no continente, como nas ilhas e ultramar, fazendo saber que seriam de grande utilidade no esforço de guerra.
Augusto Castelhano em 1916, já mobilizado pelo C.E.P. (Corpo Expedicionário Português) e em vésperas de embarcar para França.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Assim, a 23 de Fevereiro de 1916 e a pedido do governo britânico, as autoridades portuguesas apresaram os navios alemães que se encontravam estacionados nos portos do continente português, ilhas e colónias e em Abril e Julho do mesmo ano, foi igualmente executada a requisição dos vapores austro-húngaros. Na totalidade, o governo português apreendeu 72 navios.
De imediato, a Alemanha declara guerra a Portugal e pouco depois, segue-se o corte de relações diplomáticas com a Áustria-Hungria.
Acto de guerra. O arriar do pavilhão alemão do vapor Enérgie. Em 23 de Fevereiro de 1916 e a pedido do governo britânico, as autoridades portuguesas requisitaram todos os navios alemães surtos nos portos nacionais e coloniais.
(Foto Wikipédia)
A reacção germânica foi célere e logo no dia 9 de Março de 1916, o ministro alemão entregou em Lisboa, uma declaração de guerra ao Ministro dos Negócios Estrangeiros português. Ora, o anúncio da eventual entrada na guerra de tropas portuguesas no espaço europeu espalhou-se de norte a sul do país como rastilho imparável e provocou um impacto brutal na sociedade portuguesa.
Apesar de fortíssima contestação e de repúdio pela participação na guerra, tanto do sector civil como militar, o governo português decretou a mobilização geral no início do mês de Junho de 1916. Os cidadãos lusos entre os 20 e os 45 anos de idade são chamados a prestar Serviço Militar Obrigatório. As autoridades oficiais justificam a tomada de posição com o argumento da defesa das possessões coloniais em África.
Apesar de algumas reticências por parte da Inglaterra, o governo português impôs a presença de Portugal no palco de guerra europeu e vai envolver-se em duas frentes de combate: África e Europa.
As tropas mobilizadas serão integradas num organismo entretanto criado, o Corpo Expedicionário Português-C.E.P. sob a direcção de Norton de Matos na qualidade de Ministro da Guerra e o concurso do general Tamagnini de Abreu.
Cartaz com o rei Jorge V de Inglaterra e o Presidente da República Portuguesa, Bernardino Machado depois do Governo Britânico solicitar em Fevereiro de 1916, a intervenção de Portugal na 1ª Guerra Mundial.
(Restos de Colecção - Portugal na 1ª Guerra Mundial)
Aos militares mobilizados e após receberem instrução preliminar ministrada nos quarteis da 2ª, 5ª e 7ª Divisões (Viseu, Coimbra e Tomar,), serão acantonados no Campo de Instrução de Tancos durante os meses de Abril a Junho de 1916 onde vão praticar exercícios militares conjuntos tendo em vista a campanha militar no teatro de guerra na Europa.
Treino preliminar das tropas do C.E.P. (Corpo Expedicionário Português) no Campo de Instrução de Tancos em Agosto de 1916.
(Foto Wikipédia)
Em Agosto findam os exercícios do primeiro contingente da Divisão de Instrução (20.000 homens das armas de Sapadores, Cavalaria e Infantaria) e até ao termo do ano de 1916 será reforçada com mais 10.000 militares, sendo acrescido por duas Divisões no ano de 1917. Isto é, perfazendo um total de 55.165 homens, além de 54 mulheres (enfermeiras da Cruz Vermelha.
Embarque de tropas do C.E.P.-Corpo Expedicionário Português no Cais de Alcântara com destino ao porto francês de Brest.
Ainda a 30 de Agosto de 1916, chega a Portugal a Missão Militar Anglo-francesa com a finalidade de planear com o Estado-Maior Português, a melhor forma de utilização das tropas portuguesas no âmbito da coligação dos Aliados Assim e no seguimento de várias reuniões entre as partes, o Ministério da Guerra inglês (através de telegrama enviado no dia 5 de Novembro de 1916), estabelece a colaboração de Portugal no teatro de operações em França e que assentavam em três pontos principais: os militares portugueses ficariam sob as ordens de Sir Douglas Haig do Comando Superior Britânico, embora com larga autonomia; as tropas receberiam treino complementar em França antes da sua intervenção na “Linha da Frente”; o governo britânico assegurava, não só transporte, mas também o adequado equipamento das tropas portuguesas.
Com a proximidade do embarque para França verificam-se focos de resistência à incorporação no C.E.P. que se vão intensificar no mês de Dezembro, a par de insubordinações nos quartéis, deserções, etc. Receando o rápido alastramento das crescentes desmotivações, as autoridades oficiais elaboram o plano de embarque com a maior urgência possível tendo na devida conta, a capacidade dos navios disponíveis: sete embarcações britânicas e dois navios portugueses (Pedro Nunes e Gil Vicente).
Manuel Maria Marques (irmão de Maria Augusta Marques, futura esposa de Augusto Castelhano em 1937), combatente nas campanhas de Angola em 1917/18 contra as tropas germânicas.
A 18 de Janeiro de 1917, Fernando Tamagnini de Abreu é nomeado comandante do Corpo Expedicionário Português e a 30 de Janeiro de 1917 zarparam do Cais de Alcântara (Lisboa) com destino a França, três vapores britânicos que levavam a bordo as primeiras tropas portuguesas: a 1ª Brigada do C.E.P. (onde se incluía o soldado Augusto Castelhano) comandada pelo general Gomes da Costa. Quando desembarcam a 2 de Fevereiro de 1917 e após transporem o portaló dos navios pisando terra firme, Augusto Castelhano e os seus camaradas de armas encontram-se na região da Bretanha, precisamente na cidade portuária de Brest que alberga um extenso conjunto de infra-estruturas, entre as quais o arsenal, utilizado desde há vários séculos como a base principal da Marinha Francesa para a Costa Atlântica. E assim, impreparados nas lides militares, escassamente equipados tanto a nível de fardamentos (impróprios para temperaturas extremas) como em armamento, os bisonhos militares portugueses serão atirados para um terrível ambiente de guerra onde se vão engolfar nos horrores de combates contundentes como se tratassem de “carne p’ra canhão”. Imediatamente, as tropas portuguesas serão deslocadas de Brest para o norte de França (zona da Flandres) por meio de transportes militares e o C.E.P. vai ocupar um sector junto dos britânicos (Artois perto de Armentiêres). Após curta mas intensa preparação militar proporcionada pelo exército inglês (já presente no terreno desde o ano de 1914) versando cursos especializados sobre diversas armas que iriam completar a instrução facultada em Tancos (tiro, esgrima, granadas, gaz, metralhadoras, observação, patrulhas, etc. além do desejável fornecimento de compatíveis fardamentos às condições climatéricas existentes em latitudes mais a norte do continente europeu.
Augusto Castelhano em 3 de Novembro de 1917 em plena 1ª Grande Guerra de 1914-18 em França. A dedicatória: “À minha querida mãe, com muitas saudades, e para que nunca se esqueça de mim”. Augusto.
As tropas portuguesas são lançadas em combate da Linha da Frente pela primeira vez no dia 2 de Abril 1917. Augusto Castelhano e seus companheiros de infortúnio irão enfrentar impiedosos confrontos com as aguerridas tropas germânicas em circunstâncias e cenários verdadeiramente dramáticos e onde, atolados na lama gelada das trincheiras da Flandres, serão fustigados pelas severas intempéries de frio intensíssimo ou granizo, chuva ou neve, sofrem penosas agruras sem fim, acossados tanto pela fome mais pungente, como da ameaça do sinistro gaz asfixiante e o pânico dos combates, o temor da mortífera metralha do inimigo ou a ameaça constante de ferimento ou morte.
Augusto Castelhano sairá do funesto conflito ligeiramente atingido por pequeno estilhaço de granada que felizmente não deixará quaisquer sequelas. Carregadinho de saudades e em condições físicas extremamente deploráveis, regressa a Portugal apenas em Março de 1919, isto é, período temporal demasiado longo depois das nações beligerantes acordarem na assinatura do Armistício que ocorreu a 11 de Novembro de 1918. Apenas guardará como recordações do mau passadio em terras de França, o cinturão do fardamento britânico, um conjunto de moedas (francos), a bandeira da República Portuguesa e que em 1943, Maria Augusta (2ª esposa de Augusto Castelhano) cortaria a meio e transformaria o tecido vermelho numa blusa para o filho Fausto Augusto que ficou absolutamente embevecido.
(Foto de Wikipédia-Restos de Colecção)
Ainda a 30 de Agosto de 1916, chega a Portugal a Missão Militar Anglo-francesa com a finalidade de planear com o Estado-Maior Português, a melhor forma de utilização das tropas portuguesas no âmbito da coligação dos Aliados Assim e no seguimento de várias reuniões entre as partes, o Ministério da Guerra inglês (através de telegrama enviado no dia 5 de Novembro de 1916), estabelece a colaboração de Portugal no teatro de operações em França e que assentavam em três pontos principais: os militares portugueses ficariam sob as ordens de Sir Douglas Haig do Comando Superior Britânico, embora com larga autonomia; as tropas receberiam treino complementar em França antes da sua intervenção na “Linha da Frente”; o governo britânico assegurava, não só transporte, mas também o adequado equipamento das tropas portuguesas.
A “guerra de trincheiras” em plena planície da Flandres (França) na 1ª Guerra Mundial.
(Foto Wikipédia)
Com a proximidade do embarque para França verificam-se focos de resistência à incorporação no C.E.P. que se vão intensificar no mês de Dezembro, a par de insubordinações nos quartéis, deserções, etc. Receando o rápido alastramento das crescentes desmotivações, as autoridades oficiais elaboram o plano de embarque com a maior urgência possível tendo na devida conta, a capacidade dos navios disponíveis: sete embarcações britânicas e dois navios portugueses (Pedro Nunes e Gil Vicente).
Manuel Maria Marques (irmão de Maria Augusta Marques, futura esposa de Augusto Castelhano em 1937), combatente nas campanhas de Angola em 1917/18 contra as tropas germânicas.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
A 18 de Janeiro de 1917, Fernando Tamagnini de Abreu é nomeado comandante do Corpo Expedicionário Português e a 30 de Janeiro de 1917 zarparam do Cais de Alcântara (Lisboa) com destino a França, três vapores britânicos que levavam a bordo as primeiras tropas portuguesas: a 1ª Brigada do C.E.P. (onde se incluía o soldado Augusto Castelhano) comandada pelo general Gomes da Costa. Quando desembarcam a 2 de Fevereiro de 1917 e após transporem o portaló dos navios pisando terra firme, Augusto Castelhano e os seus camaradas de armas encontram-se na região da Bretanha, precisamente na cidade portuária de Brest que alberga um extenso conjunto de infra-estruturas, entre as quais o arsenal, utilizado desde há vários séculos como a base principal da Marinha Francesa para a Costa Atlântica. E assim, impreparados nas lides militares, escassamente equipados tanto a nível de fardamentos (impróprios para temperaturas extremas) como em armamento, os bisonhos militares portugueses serão atirados para um terrível ambiente de guerra onde se vão engolfar nos horrores de combates contundentes como se tratassem de “carne p’ra canhão”. Imediatamente, as tropas portuguesas serão deslocadas de Brest para o norte de França (zona da Flandres) por meio de transportes militares e o C.E.P. vai ocupar um sector junto dos britânicos (Artois perto de Armentiêres). Após curta mas intensa preparação militar proporcionada pelo exército inglês (já presente no terreno desde o ano de 1914) versando cursos especializados sobre diversas armas que iriam completar a instrução facultada em Tancos (tiro, esgrima, granadas, gaz, metralhadoras, observação, patrulhas, etc. além do desejável fornecimento de compatíveis fardamentos às condições climatéricas existentes em latitudes mais a norte do continente europeu.
Augusto Castelhano em 3 de Novembro de 1917 em plena 1ª Grande Guerra de 1914-18 em França. A dedicatória: “À minha querida mãe, com muitas saudades, e para que nunca se esqueça de mim”. Augusto.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
As tropas portuguesas são lançadas em combate da Linha da Frente pela primeira vez no dia 2 de Abril 1917. Augusto Castelhano e seus companheiros de infortúnio irão enfrentar impiedosos confrontos com as aguerridas tropas germânicas em circunstâncias e cenários verdadeiramente dramáticos e onde, atolados na lama gelada das trincheiras da Flandres, serão fustigados pelas severas intempéries de frio intensíssimo ou granizo, chuva ou neve, sofrem penosas agruras sem fim, acossados tanto pela fome mais pungente, como da ameaça do sinistro gaz asfixiante e o pânico dos combates, o temor da mortífera metralha do inimigo ou a ameaça constante de ferimento ou morte.
Augusto Rodrigues Castelhano em 11 de Fevereiro de 1918 em plena 1ª Guerra Mundial na Flandres.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Augusto Castelhano sairá do funesto conflito ligeiramente atingido por pequeno estilhaço de granada que felizmente não deixará quaisquer sequelas. Carregadinho de saudades e em condições físicas extremamente deploráveis, regressa a Portugal apenas em Março de 1919, isto é, período temporal demasiado longo depois das nações beligerantes acordarem na assinatura do Armistício que ocorreu a 11 de Novembro de 1918. Apenas guardará como recordações do mau passadio em terras de França, o cinturão do fardamento britânico, um conjunto de moedas (francos), a bandeira da República Portuguesa e que em 1943, Maria Augusta (2ª esposa de Augusto Castelhano) cortaria a meio e transformaria o tecido vermelho numa blusa para o filho Fausto Augusto que ficou absolutamente embevecido.
Aurora Mendes de Almeida, natural do lugar de Carvalha, freguesia de Penalva de Alva (Concelho de Oliveira do Hospital) e primeira esposa de Augusto Rodrigues Castelhano.
(Foto cedida por Teresa Castelhano)
Na sua relação com o sagrado, conservará o estranho amuleto contra os perigos que enfrentaria nos campos de batalha da Europa e que a sua mãe e minha avó, Margarida Duarte, lhe dependurara ao pescoço antes de partir para França em Janeiro de 1917: um pequenino saco de pano preso por um cordão e que anos mais tarde, precisamente em 1948, resolvemos abrir, tendo-se constatado que continha sementes misteriosas de uma qualquer planta de efeitos protectores que, afinal de contas seria a primacial virtude de tais talismãs. Manteve, ainda o medalhão da Liga dos Combatentes da Grande Guerra de que se orgulhava de modo particular e que a seu muito levou p’rá tumba quando faleceu a 12 de Janeiro de 1970.
Augusto Rodrigues Castelhano em 1925.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Nesse mesmo ano de 1918 e com a idade de 26 anos, contraiu matrimónio com a jovem namorada que deixara em Portugal durante o período de tempo em que participou na 1ª Guerra Mundial, Aurora Mendes de Almeida (doméstica), natural do lugar de Carvalha, freguesia beirã de Penalva d’Alva (concelho de Oliveira do Hospital), onde nasceu a 19 de Dezembro de 1891, filha de António d’Almeida (falecido a 9/1/1918) e de Maria da Piedade Mendes (faleceu a 12/3/1939). Os recém-casados fixaram domicílio na Quinta do Fole (Quinta do Paraíso), sita na antiga Estrada de Sacavém, 183. Ainda no ano de 1920 e residentes no mesmo local, Augusto Castelhano vai dedicar-se à venda de leite porta-a-porta nas ruas da cidade de Lisboa, aliás uma actividade bastante difundida na capital lisboeta. De permeio, ocorre o nascimento do primogénito António d’Almeida Castelhano no dia 19 de Maio de 1920 tendo sido registado com a naturalidade da Freguesia de Arroios, Concelho de Lisboa. Os tios Manuel Rodrigues Castelhano (leiteiro) e a esposa Antónia de Jesus Castelhano (doméstica), também moradores na Quinta do Fole (Estrada de Sacavém, 183) apresentaram-se como padrinhos de baptismo do sobrinho António. Corria o ano de 1923 quando Augusto Castelhano vai enveredar por outra ocupação e assim, decide estabelecer-se com um café/leitaria, situado na Rua Carlos Testa, freguesia de S. Sebastião da Pedreira, onde permanecerá até ao termo de 1925, ano em que trespassou o referido estabelecimento comercial.
O leiteiro João Maria Marques (irmão de Maria Augusta Marques, amigo e conterrâneo de Augusto Castelhano) em 3 de Abril de 1920 na distribuição de leite ao domicílio na cidade de Lisboa.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Ora, no mesmo ano de 1923, o irmão mais velho, Manuel Castelhano, arrendou para fins agrícolas, a Quinta de S. João, sita na Estrada da Luz, 152 e transcorrido breve espaço de tempo, tornou-se próspero agricultor. Pois bem, aproveitando a ocasião, a família de Augusto Castelhano vai residir, também, na citada quinta ocupando uma habitação disponível cedida pelo irmão Manuel Castelhano.
António d’Almeida Castelhano, filho primogénito de Augusto Rodrigues Castelhano e de Aurora Mendes de Almeida nasceu a 19 de Maio de 1920 na Quinta do Fole (Quinta do Paraíso), Estrada de Sacavém, 183.
(Foto cedida por Teresa Castelhano)
Entretanto, a 22 de Maio de 1925 e no novo domicílio localizado na da Quinta de S. João (Estrada da Luz, 152 - Freguesia de Benfica), ocorre o nascimento do segundo rebento do casal Augusto e Aurora: Lucialina de Almeida Castelhano. O baptizado efectuou-se na Igreja Paroquial de Benfica e os tios Manuel Rodrigues Castelhano (agora, agricultor) e a esposa Antónia de Jesus, moradores na já referida Quinta de S. João, foram os padrinhos. As constantes insistências de Manuel Castelhano sobre o irmão mais novo surtiram efeito positivo e assim, Augusto Castelhano acabou por anuir aos seus conselhos e em 1926, após oportuno trespasse da loja, largou o negócio do café/pastelaria da Rua Carlos Testa e tomou de arrendamento a soberba Quinta de Montalegre (vizinha da Quinta de S. João, Estrada da Luz) e que se encontrava nitidamente subaproveitada. A excelente herdade sobressaía, sobretudo pela existência de solos fertilíssimos e água em abundância, excelente olival com cerca de 2.000 pés de oliveiras, inúmeras espécies de árvores frutícolas, além de acolhedora área de lazer constituída por encantador bosque de buchos ornamentado pela espectacular Cascata Monumental que era abastecida por inesgotável mina de águas cristalinas. A Quinta de Montalegre englobava, também vários aposentos de habitação e de apoio aos trabalhadores rurais, vacaria e cavalariça, estábulos, palheiros e arrecadações para alfaias agrícolas e outras, capoeiras (coelhos e galinhas) e pocilgas para suínos, etc.
Maria Mendes da Piedade (falecida em 12/3/1939) mãe de Aurora Mendes de Almeida (primeira esposa de Augusto Rodrigues Castelhano) com a neta nascida em 1929, Maria Manuela d’Almeida Castelhano. Encontra-se ladeada por dois outros netos (Aurora e José) filhos de Isaura, uma outra filha Maria Mendes da Piedade moradora na Estrada da Luz, 181.
(Foto cedida por Teresa Castelhano)
Augusto Castelhano firmou contractos de arrendamento anuais com a titular da Quinta de Montalegre e rodeou-se de um valioso grupo de dedicados trabalhadores rurais contratados, mormente na região de Aveiro (António Russo, Manuel Rodrigues, (“ti’ Conde”), Godinho, Gonçalo, António Augusto (casado com Olívia Marques, irmã de Maria Augusta Marques, futura esposa do segundo matrimónio de Augusto Castelhano e tantos outros) e que no decorrer das suas existências continuaram a manter sólidas amizades com a família de Augusto Castelhano e os seus descendentes.
As três filhas do casal Augusto e Aurora em 1937: Maria Manuela, Lucialina, uma amiga, e Maria Helena, posam na Quinta de Montalegre em Carnide/Benfica.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Aos poucos, apetrechou a vacaria de vacas leiteiras (que atingem o número máximo de três dezenas), além de possante junta de bois exclusivamente destinados à tracção nas tarefas da lavoura (arados, charruas ou carroças, etc.) e o indispensável boi de cobrição, rezes adquiridas mormente nas feiras de gado da Malveira, Moita e Pinhal Novo e também, o garboso cavalo (com que sempre sonhara) que atrelava à galera aquando dos passeios dominicais ou dias festivos. Imprime uma notável dinâmica no desenvolvimento da herdade de modo a usufruir das suas enormes potencialidades. Os óptimos proventos obtidos na magnífica exploração agrícola da Quinta de Montalegre vão assentar doravante, sobre quatro principais pilares principais e que passaram a registar elevados índices de eficiência: Cerealífero, tanto de sequeiro (trigo, aveia, milho), como de regadio, além de forragem destinada à alimentação de gado, principalmente bovino; sector leiteiro a cargo de três dezenas de vacas de elevado rendimento; olivicultura, área de superior relevância e que abrangia valioso olival composto por dois milhares de pés de oliveiras de castas de óptima produtividade e donde se obtinham apreciáveis volumes de azeite catalogado de qualidade extra; horticultura onde se produziam as mais variadas de espécies de leguminosas graças à luxuriante horta irrigada por abundante água de poço extraída por meio da peculiar turbina eólica que despejava o precioso líquido num enorme reservatório muitíssimo conhecido nas redondezas: o tão famoso tanque/piscina da Quinta de Montalegre onde tantos e tantos jovens deram as primeiras braçadas.
Augusto Castelhano (já viúvo), filhos e familiares em 1937 posam no tanque de rega da horta na Quinta de Montalegre. No primeiro plano, as filhas Maria Helena e Maria Manuela e ainda, a sogra (primeiro casamento) Maria Mendes de Almeida. No segundo plano, Augusto Castelhano, familiares, a filha Lucialina e o filho António.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Implementou a extracção intensiva de argila da lucrativa “barreira” que albergava fartas reservas de matéria-prima e negoceia novos e vantajosos contratos de fornecimento de barro com as reputadas Cerâmica de Carnide (Quinta do Sagrado Coração de Jesus, Azinhaga dos Cerejais) e a Cerâmica Sanches, situada uma pouco além da confluência da Azinhaga do Ramalho com a Rua dos Soeiros. Diariamente fornece os mais variadíssimos géneros de leguminosas e hortícolas, tanto ao Mercado da Praça da Figueira (encerrada em 1947), como noutros locais de venda das proximidades e, também na própria Quinta de Montalegre.
João Maria Marques, a esposa Maria do Rosário (pais de Maria Augusta Marques) e o filho Augusto Marques (irmão de Maria Augusta Marques em vésperas de emigrar para o Brasil) em Salreu (Concelho de Estarreja) em 1920.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Enquanto progride de modo acentuado no plano económico mercê de fartos proventos conseguidos na exploração agrícola da Quinta de Montalegre, o casal Augusto e Aurora será enriquecido com o nascimento de mais duas filhas no breve espaço de dois anos. Maria Manuela nasceu a 30 de Janeiro de 1929 e será baptizada na Igreja Paroquial de Benfica, tendo como padrinhos, os tios Manuel Francisco da Silva e esposa Isaura Mendes de Almeida, residentes na Rua Alves Torgo, 194 em Lisboa. Maria Helena que vem ao mundo a 14 de Maio de 1931, baptizada na Igreja Paroquial de Benfica e onde teve como padrinhos, Helen Alexander e Leonard Abbot Pearson.
Maria Augusta Marques (a última, à direita e que casaria com Augusto Castelhano) com as irmãs (Guilhermina, Adelaide (emigrou para o Brasil), Maria, Olívia e Francelina), o irmão Augusto (em vésperas de emigrar para o Brasil) e o pai João Maria Marques (alfaiate) em Salreu, 1919.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Porém, a vida nem sempre é recheada de rosas e, no decurso de 1936, uma inesperada e dolorosa tragédia abate-se sobre a família de Augusto Castelhano: grave e irreversível doença acomete a esposa Aurora que culminará no seu falecimento no dia 11 de Setembro deste mesmo ano. Agora com 44 anos, Augusto Castelhano fica com o encargo de quatro filhos menores e, apesar de enfrentar um tremendo abalo emocional com o falecimento da sua esposa, consegue recuperar pouco a pouco do difícil transe que lhe surgiu portas adentro.
Maria Augusta Marques em 1928 contraiu matrimónio com Augusto Rodrigues Castelhano no dia 2 de Junho de 1937 na Igreja de S. Martinho de Salreu.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Pois bem, no intuito de reconstituir o agregado familiar, Augusto Castelhano toma a decisão de contrair novo enlace, agora com Maria Augusta Marques, filha de João Maria Marques (alfaiate) e de Maria do Rosário (doméstica), conterrânea e procedente de família já conhecida e amiga, natural do lugar do Picoto, freguesia de Salreu (concelho de Estarreja). Maria Augusta Marques nasceu no dia 19 de Abril de 1902 e fazia parte de uma família bastante numerosa composto por 12 irmãos, seis do sexo masculino e seis do sexo feminino. A cerimónia nupcial realizou-se no dia 2 de Junho de 1937 na Igreja Matriz de S. Martinho de Salreu, concelho de Estarreja. Em 1938 e na sequência da habilitação de herdeiros originada pelo falecimento da primeira esposa, os haveres existentes serão retalhados e redistribuídos por Augusto Castelhano e pelos filhos do primeiro casamento, património que será reposto facilmente. Do segundo casamento de Augusto Castelhano com Maria Augusta vão surgir mais três filhos: Carlos Alberto (Quinta de Montalegre, Benfica/Lisboa, 9 de Maio de 1938), Fausto Augusto (Quinta de Montalegre, Benfica/Lisboa,11 de Maio de 1940 e registado na freguesia de Salreu/Estarreja/Aveiro, apenas em 11 de Agosto de 1941) e Orlando Manuel (Quinta do Charquinho, Benfica/Lisboa, 12 de Setembro de 1945).
Casamento de Augusto Castelhano com Maria Augusta Marques no dia 2 de Junho de 1937 realizado na Igreja Paroquial de S. Martinho, freguesia de Salreu, concelho de Estarreja.
(Foto do Arquivo de Fausto Castelhano)
Desde a sua chegada a Lisboa em 1907, Augusto Castelhano seguiu atentamente as movimentações operadas no plano político, social e económico que alteraram de modo bastante profundo a sociedade portuguesa. Mantinha-se, na medida dos possíveis, ao corrente dos acontecimentos, tanto no país como no estrangeiro por intermédio da leitura assídua do seu jornal de eleição, o Diário de Notícias, não obstante as frequentes restrições impostas pelas odiosas Comissões de Censura. O salutar hábito não se alterou depois do seu regresso da Flandres onde participou na 1ª Guerra Mundial e desde então, dedicará sempre esmerada atenção…
Carlos Alberto, nascido em 9 de Maio de 1938 e filho primogénito do casal Augusto Castelhano e Maria Augusta Marques - Foto de 15 de Dezembro de 1938.
(Arquivo de Fausto Castelhano)
E factos relevantes foram sucedendo: a tentativa de golpe militar de direita de 18 de Abril de 1925 liderada pelo general monárquico Sínel de Cordes, coadjuvado pelo capitão-de-fragata Filomeno da Câmara (Cruzada Nun'Álvares) e pelo republicano-conservador, tenente-coronel Raul Esteves. O golpe será frustrado pela actuação das forças policiais e militares com o apoio das massas populares, adeptas do governo que resolveu de imediato, declarar o estado de sítio em todo o País. A 19 de Julho de 1925, irrompe a Revolta da Marinha chefiada pelo capitão-de-fragata Mendes Cabeçadas (republicano conservador). O pronunciamento militar de 28 de Maio de 1926, chefiado pelo general Gomes da Costa tem lugar em Braga e a sua entrada triunfal comandando cerca de 15.000 homens, sucede a 6 de Junho de 1926. A 30 de Novembro de 1926, investidura de Óscar Carmona como Presidente da República e a 17 de Março de 1928, criação da Polícia de Informações, resultante da fusão das congéneres de Lisboa e do Porto, subordinada ao Ministro do Interior. A Revolta Militar na Madeira contra a ditadura é desencadeada a 4 de Abril de 1931 e a revolta dos Açores surge a 10 de Abril de 1931 provocada pelos presos políticos das ilhas açorianas de S. Miguel e Terceira contra o Governo de Lisboa. A proclamação da República de Espanha sucede no dia 14 de Abril de 1931 e a 5 de Julho de 1932, Oliveira Salazar será empossado como Presidente do Ministério.
O pronunciamento militar na madrugada do dia 28 de Maio de 1926 do general Gomes da Costa que chefiando a Junta de Salvação Pública proclama a partir de Braga que “A nação quer um governo forte que tenha por missão salvar a Pátria e que concentre em si todos os poderes para, na hora própria, os restituir a uma verdadeira representação nacional”.
(Foto Wikipédia, Restos de Colecção)
A 23 de Janeiro de 1933, directamente dependente do Ministério do Interior e destinada a actuar em todo o território metropolitano, é criada a Polícia de Defesa Política e Social. A 19 de Março de 1933, o projecto de Constituição Política será aprovado em plebiscito e no dia 11 de Abril de 1933, entra em vigor a Constituição Política da República Portuguesa.
Embarque de presos políticos do Movimento de 18 de Janeiro de 1934 para Angra do Heroísmo.
(Foto Wikipédia)
A criação da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE) ocorre a 29 de Agosto de 1933 e resulta da fusão da Polícia de Defesa Social e Política e da Polícia Internacional; a 10 de Novembro de 1933 serão deportados para a Fortaleza de S. João Baptista (Açores) cerca de 150 Presos Políticos. A 18 de Janeiro de 1934, tentativa de “Greve Geral Revolucionária” (Revolta da Marinha Grande) contra a legislação corporativa que vai suprimir as liberdades sindicais. A 10 de Setembro de 1935 tem lugar a tentativa revolucionária de elementos reviralhistas e nacional-sindicalistas que exigiam que o Presidente da República (Óscar Carmona) demitisse Oliveira Salazar. Ocorrem numerosas prisões e o capitão-de-mar e Guerra, Mendes Norton será desterrado para Cabo Verde. Em Espanha, vitória da Frente Popular (Republicanos de Esquerda, Socialistas, Comunistas, Trotsquistas e Sindicalistas) no dia 16 de Fevereiro de 1936, levando à formação de um governo presidido por Manuel Azaña. A 22 de Abril de 1936 é criada a Prisão do Tarrafal (“Campo da Morte Lenta”) na Ilha de Santiago (Cabo Verde) destinada a presos políticos e sociais e a célebre Mocidade Portuguesa, organização de juventude com carácter paramilitar é fundada a 19 de Maio de 1936. O início da Guerra Civil de Espanha terá início no dia 18 de Julho de 1936 com a sublevação das tropas do Exército Regular e da Legião Estrangeira chefiadas pelo general Franco, sobejamente conhecido pela sanguinolenta repressão da greve dos mineiros das Astúrias.
A miliciana francesa Maria Ginestà que se tornou um ícone da Guerra Civil de Espanha ao ser fotografada a 21 de Julho de 1936 nas açoteias do Hotel Colón de Barcelona. Faleceu aos 94 anos na cidade de Paris.
(Foto Wikipédia)
Dois dias depois, o general José Sanjuro, o cérebro da conspiração nacionalista é vítima de um desastre de avião quando se preparava para levantar voo do aeródromo da Quinta da Marinha (Cascais). Milhares de portugueses alistam-se nos famigerados Viriatos e vão participar activamente na Guerra Civil de Espanha integrados nas hostes nacionalistas do general golpista Francisco Franco.
Miguel Hernández Gilabert na linha da frente dos combates na Guerra Civil de Espanha incita os soldados republicanos. Oriundo de uma família pobre e de escassos estudos académicos, o grande poeta e dramaturgo da República Espanhola publicou o seu primeiro livro de poesias aos vinte e três anos de idade tendo obtido considerável fama antes de sua morte. Capturado em Portugal junto à fronteira, foi entregue às autoridades espanholas.
(Foto Wikipédia)
A Revolta da Marinha, coordenada pela Organização Revolucionária da Armada, afecta ao PCP-Partido Comunista português, irrompe a 8 de Setembro de 1936 e envolveu os navios Dão, Bartolomeu Dias e Afonso de Albuquerque. Os amotinados tentam, sem êxito, desviar os barcos para Espanha e colocá-los à disposição do Governo Republicano. Gorada a tentativa, serão mortos 10 marinheiros e 60 foram deportados para o Tarrafal. A 29 de Outubro de 1936 chega ao Tarrafal o primeiro contingente de presos políticos, entre os quais se encontra o secretário-geral do PCP, Bento Gonçalves. Na noite de 20 para 21 de Janeiro de 1937 e por iniciativa de grupos de anarquistas, explodem em Lisboa algumas bombas em locais bastante precisos: Ministério da Educação Nacional, Depósito de Beirolas, Depósitos da Vacuum de Alcântara, Casa de Espanha, Emissora Nacional, Rádio Clube Português e a 4 de Julho de 1937, sucede o atentado bombista contra Oliveira Salazar executado por elementos anarco-sindicalistas. Pilotos portugueses, integrados na Missão Militar Portuguesa de Observação em Espanha e que constituíam os “Viriatos do ar”, partem para o país vizinho no dia 3 de Abril de 1938 para combater na aviação franquista contra as forças republicanas, tendo-se destacado Pequito Rebelo, Pinto Basto, Soares de Oliveira e Krug.
Marinheiros da Organização Revolucionária da Armada-ORA são conduzidos, sobre escolta, para o Campo de Concentração do Tarrafal, em Outubro de 1936, por terem participado na revolta dos navios de guerra Bartolomeu Dias e Afonso de Albuquerque.
(Foto do Arquivo da Direcção-Geral de Comunicação Social)
Assinatura do "Pacto Ibérico" em 17 de Março de 1939, o Tratado de Amizade e Não-Agressão entre Portugal e Espanha; a 29 de Março de 1939 em Lisboa, manifestação de regozijo pela vitória do general Franco na Guerra Civil de Espanha e a 19 de Maio de 1939 na cidade de Madrid, desfile da “Vitória” dos nacionalistas de Francisco Franco e onde participaram os "Viriatos". Os “Viriatos” regressam a Portugal no dia 8 de Junho de 1939, apresentam-se a Santos Costa e são recebidos na Câmara Municipal de Lisboa pela União Nacional e pela Legião Portuguesa. O general Millan Astray vem a Lisboa agradecer a Salazar, em nome do general Franco e das Forças Armadas Espanholas, o auxílio dos voluntários portugueses.
O Sr. Ministro da Educação Nacional saudado à sua entrada no Instituto do Professorado Primário.
(Foto do Diário de Notícias)
Pois bem, ao folhear o “Diário de Notícias” no dia 11 de Junho de 1939 e logo na 1ª página, Augusto Castelhano deu de “caras” com o destacado anúncio da “Volta a Portugal em bicicleta” nos seguintes termos: “A Volta a Portugal” vai realizar-se este ano com características desportivas e populares absolutamente novas”. Fervoroso admirador da popular modalidade desportiva desde há muito tempo, Augusto Castelhano ficou verdadeiramente encantado. Todavia, ainda na 1ª página do matutino de Augusto de Castro, sobressaíam os títulos de outras notícias de real interesse, a saber: “As homenagens (de ontem) aos Senhores Presidente da República e Presidente do Conselho e à memória de Sidónio Pais no Instituto do Professorado Primário”. A notícia era acompanhada de foto com legenda, assim: “O Sr. Ministro da Educação Nacional saudado à sua entrada no Instituto” e onde se observava um grupo de educandos fazendo a saudação nazi/fascista. Outro título que incluía duas fotos referentes à terrível intempérie no norte de Portugal em pleno mês de Junho: “A catástrofe de Ponte do Lima foi das mais desastrosas dos últimos tempos”. Uma curta nota referia a próxima visita a Portugal do alucinado general franquista Millan Astray que se tornara célebre pela frase “Viva la Muerte”, além dos incontáveis desmandos praticados na Guerra Civil de Espanha: “Millan Astray assiste à festa do S. Luís depois de amanha”.
O capitão Botelho Moniz (em primeiro plano) no banquete oferecido pela Rádio Clube Português em honra dos famigerados “Viriatos” que, integrados nas hostes de Francisco Franco na Guerra Civil de Espanha, combateram contra o governo legítimo da República de Espanha.
(Foto do Diário de Notícias)
E no rescaldo da Guerra Civil de Espanha, outra saliente notícia com foto condizente, rezava assim: “Decorreu num ambiente de grande elevação patriótica o banquete oferecido pelo Rádio Clube Português aos “Viriatos” (tratava-se dos famigerados “Viriatos” que desempenharam um vergonhoso papel no combate ao governo legítimo da República de Espanha) e aos correspondentes de guerra (Guerra Civil de Espanha). Ainda outro título: “Artur Ribeiro Lopes fez ontem uma notável conferência em Bruxelas na qual historiou o ressurgimento de Portugal e a obra do Doutor Oliveira Salazar”. Mas, uma notícia intrigante inserida no Diário de Notícias nesse dia 11 de Junho de 1939 deixou Augusto Castelhano verdadeiramente estupefacto: “Esta tarde choverá dinheiro sobre Lisboa”.
Continua...
** O autor repudia o Novo Acordo Ortográfico
Muito obrigado mesmo, sr. Fausto. Gostei por demais de ler esta terceira parte, que fiz de um fôlego. O tema é muito interessante, o da vida de uma família real ao longo de mais de um século entretecida com a história do país e do mundo; e para mais desenvolvido numa escrita escorreita que prende o leitor. Agradabilíssimo de ler. Que venha a quarta parte! E que não demore!
ResponderEliminarOs meus agradecimentos pelo seu amável comentário, sr. Henrique Oliveira. Espero que brevemente sairá o IV capítulo dum memorável acontecimento ocorrido em Lisboa e que resolvemos desenterrar, o que, diga-se de passagem, me tem dado um imenso gozo. (Fausto Castelhano)
ResponderEliminarExcelente relato sobre a História de Portugal. Li com redobrada atenção os acontecimentos da 1ªGuerre Mundial, onde combateram o meu avô em África e o meu tio avô em França.
ResponderEliminarPossuo, herdado da minha avó um diário de guerra escrito em vários pontos de África, onde o meu avô narra o dia a dia das vicissitudes de que foi alvo.
Obrigado Fausto, por mais este vasto e bem elaborado tema.
Aguardo com ansiedade o IV capítulo.
Mais uma vez agradeço e bem-haja pelo seu distinto trabalho.
Ana de La Peña
Grato pela gentileza do comentário, Ana de la Peña. É sempre um incentivo para que possamos fazer cada vez melhor. Neste caso, é uma espécie de exumação dum evento de que ninguém já se lembra, exceptuando 2 pessoas ainda vivas e que assistiram a tudo quanto se passou em Junho de 1939. Por estes dias terminarei o IV e penúltimo capítulo. . Quanto ao Diário de Guerra do seu avô é, efectivamente uma preciosidade. Recentemente saiu um livro muito interessante sobre a 1ª Guerra Mundial e que adquiri e cuja autora é Isabel Pestana Marques. O título do livro "Das trincheiras com saudade" e onde são relatadas muitas peripécias ocorridas pelos militares portugueses na Flandres. Saudações amigas (Fausto Castelhano)
ResponderEliminarLi com curiosidade o seu texto.
ResponderEliminarAndo à procura de elementos referentes à Quinta do Fole ou do Paraíso que pertencia aos meus avós.
Será que terá algumas fotos a ela referentes? Se sim, ficaria muito grato se as mostrasse.
Fernando Branco