segunda-feira, 23 de abril de 2012

O Centro do Mundo


(por Vítor Vieira)



Fotografia de Alexandra Carvalho (2012)


Sentados em bancos de madeira, do tipo jardim, em pequenos muros, apoiados em parapeitos de montras ou em poiais (neste último caso à boa maneira alentejana), é assim que, à conversa com outros, consomem grande parte dos dias, alguns homens que já estão gozando as ”maravilhas” do estatuto de reformado.

Fazem-no, em especial, no espaço público sito nas imediações da igreja de Benfica.
É um espaço muito especial, que nos transporta e traz à memória ecos de uma certa ruralidade perdida (e talvez envergonhada?), tendo a mesma função social  e imaginária do “Largo”, tal como em “O fogo e as cinzas“, de Manuel da Fonseca. 

O comércio tradicional, ainda com muita vida e alguma alma, e todos aqueles que, pelas mais variadas razões por ali deambulam, completam o emolduramento do nosso cenário menos bulicioso e algo semelhante ao de muitas aldeias e vilas do nosso interior.  

Os profissionais da conversa, cumprindo quase que religiosamente os horários do comércio, falam, invariavelmente, dos tempos idos e, com um discurso algo atualista, lá vão aventando cenários ainda mais pessimistas sobre as crises pessoais, portuguesa, europeia e mundial.

Quebrando a monotonia das conversas, diálogos ou monólogos de solidão, ultimamente este espaço foi enriquecido com a presença, quase diária, de um homem estátua, o qual, dando descanso à personagem, despe as suas vestes e transforma-se em pintor ou retratista, salpicando-nos de cores com a sua arte e técnica.

Ao lado da igreja, um dos poucos monumentos aparentemente bem conservados nesta freguesia, impõe-se, com um certo despojamento, o “ Adro da igreja”, assim designado e merecendo honras de placa toponímica.

Tratando-se de um espaço relativamente amplo, com algumas árvores frondosas, não é, porém, o eleito daqueles que fazem da conversa um exercício de prática quotidiana.

Ali plantada, merece destaque uma pacata, agradável e prazenteira esplanada, que denota conviver em perfeita harmonia com a vizinha casa mortuária da igreja.

O adro da igreja, pela sua simplicidade, torna-se, assim, um espaço ideal para quem tem crianças, pois os automóveis, correndo em baixo, parecem coisas distantes e objetos do futuro.

Estes são os dias no centro do mundo….







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