segunda-feira, 14 de março de 2011

Comércio Tradicional - Espaços & Memórias (1)





(por Alexandra Carvalho com Fausto Castelhano, Mário Pires e Pedro Cabral)




O comércio tradicional é parte integrante da identidade de cada local, contribuindo para a dinamização do seu meio envolvente e constituindo património material. do mesmo. É um elo essencial da relação afectiva do território com os seus habitantes.
O comércio tradicional, para além de caracterizar social, económica e patrimonialmente uma comunidade, ajuda também a construir a memória colectiva do local em que se insere.

Pelo que urge que o comércio tradicional seja bem divulgado, não só como forma de dinamização e incremento financeiro das suas vendas, mas, também, e sobretudo, para dar a conhecer a todos os seus possíveis clientes os seus Espaços & Memórias.

Neste âmbito, em prol do importante trabalho que temos vindo a desenvolver sobre a freguesia de Benfica, o "Retalhos de Bem-Fica" inicia hoje esta nova rubrica, onde procurará inventariar o comércio tradicional existente na freguesia - numa vertente que interligará, também, o trabalho apresentado online neste blogue, com uma apresentação física em cada loja (a qual procurará realçar e valorizar ao público o trabalho desenvolvido por cada uma das lojas, assim como os seus espaços e as memórias a elas associadas).



[clicar no logótipo, para aceder a todas as lojas]


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Apresentação da Mercearia do Sr. Fernando Gonçalves.

Desenho: Pedro Cabral
Fotografias e Vídeo: Mário Pires

Todos os direitos reservados "Retalhos de Bem-Fica" (2011)






No Nº 100 A/B da Rua Cláudio Nunes continua a existir uma das mais antigas Mercearias/Tabernas da freguesia de Benfica.

Este espaço foi, em tempos idos, um lugar de flores; mais tarde, trespassado ao Sr. José Maria Gaspar (do concelho de Pampilhosa da Serra) e à sua esposa.
Quando estes faleceram, nos anos 80, e não tendo deixado descendência directa, a loja passou para o seu actual proprietário, o Sr. Fernando Gonçalves (sobrinho da esposa do antigo dono e, tal como os seus parentes, também originário do concelho de Pampilhosa da Serra).

O Sr. Fernando Gonçalves, de 77 anos, começou a trabalhar em Lisboa aos 14 anos; tendo ido para aquela que hoje é a sua loja em Junho de 1958.

À porta da sua loja continuamos a ser recebidos pelos caixotes de fruta e hortaliça, objectos de utilidade doméstica, alguidares de plástico, ratoeiras para caçar ratos e pássaros, arrastadeiras para acamados, rolhas de cortiça, bocais e chaminés para candeeiros a petróleo, etc. Uma infinidade de coisas de tempos imemoráveis que raramente se encontram em qualquer loja de comércio tradicional!…

Na porta do lado esquerdo, Nº 100 B, funciona a Taberna e, na porta à direita, Nº 100 A, a Mercearia.






Excerto da Entrevista realizada com o Sr. Fernando Gonçalves.

Contacto prévio, Apoio à Entrevista e ao Texto: Fausto Castelhano
Desenho de Fundo: Pedro Cabral
Entrevista: Alexandra Carvalho

Filmagem e Vídeo: Mário Pires

Todos os direitos reservados "Retalhos de Bem-Fica" (2011)




Tal e qual como no tempo do Sr. José Maria Gaspar quando, no regresso dos funerais no Cemitério de Benfica, os participantes no cerimonial funéreo emborcavam os primeiros baldes de vinho na costumeira peregrinação às capelinhas da ordem… Também o Sr. Fernando Gonçalves se recorda da estreita ligação que a sua loja sempre manteve com o Cemitério, sobretudo quando lá trabalhavam mais de 50 pessoas e, todos os dias, às 6h30, ali tinha que estar já na loja, pois os empregados do sepulcrário iam tomar o seu café bem cedo e "(...) a gente tinha compromissos com essa gente", como nos conta.

Actualmente, a sua loja já não fica aberta até à meia noite, como no tempo em que tudo ali à volta eram quintas. E as grandes superfícies, também, vieram "(...) dar cabo do comércio pequeno".
Mas o Sr. Fernando Gonçalves continua a receber clientes dos mais antigos e , também, alguma gente nova, que se mudou ali para a rua há muito pouco tempo... pessoas que só ali continuam a encontrar os artigos que não parecem existir em mais lado nenhum.

Segundo o Sr. Fernando Gonçalves, a sua loja "Faz parte das velharias para passar o meu tempo!"...
E a verdade é que descobrimos no Sr. Fernando Gonçalves a alma de um verdadeiro coleccionador de "velharias", verdadeiras relíquias coleccionáveis, que ele guarda com o mesmo amor, carinho e zelo com que tem cuidado da sua loja.
Como é, por exemplo, o caso da colecção de notas antigas, dos pontos mais díspares do globo, que lhe foram sendo oferecidas, ao longo dos anos, pelo seu público e ele nos mostra com orgulho e um certo embargo na voz, ao dizer-nos: "(...) sou um ajuntador, sem vender! Como é que a senhora se lembrava de vir assim ver uma data de papel velho como esta? (...) Isto é preciso ser um homem doido como eu! É o meu tabaco."




Ver aqui mais fotografias (autoria: Mário Pires) da loja do Sr. Fernando Gonçalves.








1 comentário:

Julio Amorim disse...

É importante este tipo de documentação..e esta loja sempre me fascinou. Era aqui que eu comprava os meus piões lá para a década de 60. Talvez seja nostalgia a mais mas adoro estes lugares onde o tempo parou.