sábado, 19 de junho de 2010

O 25 de Abril e a RTP (II)





Todos os direitos reservados @ Fausto Castelhano, "Retalhos de Bem-Fica" (2010)



[Ler o Capítulo 1 aqui]



(ou quando o Movimento das Forças Armadas se esqueceu de “conquistar” o Centro Emissor de Monsanto…)


por Fausto Castelhano



Capítulo 2


A madrugada do 25 de Abril de 1974





A madrugada já ia alta quando é proferido o primeiro comunicado dum tal Movimento das Forças Armadas, difundido pelo Rádio Clube Português e na voz de Joaquim Furtado. Por fortuna, já me encontrava acordado há um bom bocado e com o auscultador do rádio portátil encaixado no ouvido esquerdo (3). Não consigo descortinar um motivo plausível para tal propensão e, admito que seja mera sugestão, porém tornava-se mais cómodo e com a nítida sensação de uma melhor audição… Adquiri esse hábito desde há muito tempo e auxilia-me a pegar no sono mais facilmente já que, sempre dormi “mal e porcamente”, como se costuma dizer… Para mim, três ou quatro horas será o suficiente para o meu descanso diário e, a partir daí, não aguento a “despertina” e…“ala que se faz tarde”!



Quartel do Regimento de Infantaria 5 nas Caldas da Rainha.
(Foto Wikipedia)




E foi assim, por simples acaso, e porque estava sintonizado na onda média daquela estação de radiodifusão, que me permitiu escutar, por volta das 04:26 da “matina”, a inesperada mensagem de contornos, algo nebulosos, do Movimento das Forças Armadas. (4) Estremeci e, repentinamente, lembrei-me da incomensurável tragédia do 11 de Setembro de 1973, no Chile de Salvador Allende (provocada pela golpada de Augusto Pinochet e seus sequazes) ocorrida meses antes, mas arredei, imediatamente, esse mau e angustioso pensamento. Todavia, o teor do comunicado suscitou-me alguma preocupação, fiquei um pouco cismático e com a pulga atrás da orelha…



Fachada do edifício do Centro Emissor de Monsanto, a parada e a escadaria da entrada principal.
(Foto de Fausto Castelhano)




No mês anterior, sucedera a sexta-feira fria e nevoenta do 16 de Março (5) quando a tropa do Regimento de Infantaria 5, aquartelada nas Caldas da Rainha, avançara de madrugada até às portas de Lisboa e agora, acontecia outra sublevação dos militares… Algo de volumoso impacto, ou não, se estaria a passar no país e, novamente, ao nível das Forças Armadas… O que pretendiam, para que lado iriam tombar quando surgisse a hora crucial de se definirem e tomarem decisões sérias e concretas isto é, ao soarem as trombetas da verdade… E que forças estariam envolvidas na movimentação? O Exército, a Marinha, a Força Aérea, a Guarda Nacional Republicana? Para mim, o impacto daquele momento era gerador de evidente e singular expectativa, uma insondável incógnita…



Original da 1ª licença (3/8/1964) do Emissor Siemens do 1º Programa da RTP no Centro Emissor de Monsanto – Benfica – Lisboa.
(Documento de Fausto Castelhano)



Não obstante, e uma vez que o Comunicado do Movimento das Forças Armadas fora emitido pelo Rádio Clube Português deduzi que, pelo menos, tanto os estúdios como os próprios emissores (do Porto Alto) da estação emissora já se encontrariam, na melhor das hipóteses, arrebanhados… Será que os militares teriam ocupado outras estruturas consideradas pontos-chave?
Contudo, na leitura do Comunicado houve um pormenor que me causou um misto de apreensão, perplexidade e desconfiança das reais intenções do chamado Movimento das Forças Armadas, vulgo MFA: “a fim de evitar qualquer incidente, a população deve recolher a casa e manter-se calma”… Ou seja, não fazer ondas e… bico calado…



Fausto Castelhano junto do Emissor do 1º Programa da RTP - Canal 7 (entrada em funcionamento a 7 de Março de 1957). - Reparem no tamanho do equipamento que, afinal, incluía 2 emissores: Emissor de Imagem de 10 KW e Emissor de Som de 2 KW) – A porta aberta do último bastidor, à direita, é o amplificador de 1 KW do Emissor de Imagem - Centro Emissor de Monsanto.
(Dezembro de 1966 - Foto de Fausto Castelhano)



Larguei, logo ali, um gordo e ofensivo palavrão que me abstenho de reproduzir na íntegra… O que é que esta gajada espertalhuça, desta vez, estará a maquinar? Revolução “à séria” não será de certeza absoluta, longe disso… Que raio!... Em parte alguma do planeta ou em qualquer época da História se desenvolveram revoluções, p’ra valer, encafuando o maralhal em casa… Dava que matutar… e de que maneira…



Válvula de potência (em cobre revestida a prata) do Amplificador de 1KW do Emissor de Imagem do 1º Programa da RTP de Monsanto - Canal7.
(Foto de Fausto Castelhano)



Pelos indícios, já que estava em curso uma cerrada contestação militar, nomeadamente ao nível do Exército (devido à Guerra Colonial e ao diferendo das promoções dos Oficiais do Quadro Permanente os quais, estariam a ser ultrapassados pelos Oficiais Milicianos), a “coisa” cheirava-me a esturro e, se calhar, a mais uma precipitada e inconsequente “quartelada”, ou seja, e deixemo-nos de rodeios, mudar as moscas, os moscardos e alguma fauna inofensiva que, desde tempos imemoriais infestam a sociedade portuguesa, com o evidente propósito (não sejamos ingénuos) de ficar tudo, ou quase tudo na paz dos cemitérios… Esta foi a minha leitura…Curiosamente, ainda hoje mantenho essa inabalável convicção… (6)



A “arraia-miúda” a empurrar…sempre a empurrar…
(Foto da Wikipedia)



Porém, as recomendações dos militares deram com os “burrinhos na água” e todo o esquema laboriosamente engendrado se estraçalhou, radicalmente, com o povo à solta no meio da rua, totalmente empolgado num formidável desvario de grande exaltação patriótica e na orgia avassaladora da plena liberdade… a empurrar, a empurrar a tropa… E, claro está, em descarada desobediência aos intentos do MFA, tal como constava dos seus próprios comunicados que, insistentemente, iam sendo difundidos… martelando, martelando na mesma tecla: bom povo, desandem p´rós cortelhos e deixem-se de euforias… E, às 18:15 horas, é o próprio Salgueiro Maia que, mais uma vez, roga à multidão que abandone a área do Quartel do Carmo!



A esfuziante alegria do populacho que já não embarcava em “tangas”…
(in Wikipedia)




Pois… mas o populacho, avançou de rompante pela festarola adentro sem ser convidado e afirmou-se, mais uma vez, como o grande e destacado protagonista da História… Se não foi assim, então expliquem-me muito bem, de trás p’ra frente e da frente p’ra trás mas… tais argumentos (se existirem) devem assentar em bases sólidas e suficientemente convincentes… Sou avesso a que me comam as papas na cachola! De contrário… mantenho-me sem vacilar um milímetro que seja e não estarei equivocado na minha crença…



Agora, apertem com eles…Ou vai ou racha…
(in Wikipedia)



Confrontado com a insólita comunicação do MFA, borrifei-me no recado endereçado à população portuguesa e não hesitei um segundo… De resto, até me dava jeito uma vez que, estava de serviço naquele dia, apesar do peculiar horário de trabalho (um pouco esquisito, na verdade) que, no ano de 1970 e por intermédio duma petição, os técnicos dos Emissores de Monsanto conseguiram obter, a custo e mercê de luta abnegada e persistente, mas satisfazendo os seus principais e justos anseios… Isto é, acautelar eventuais danos de ordem física e protegendo a saúde de todos quantos ali laboravam. (7)



E nem o impagável “Tareco” (como era conhecido o monárquico Francisco de Sousa Tavares) empoleirado na guarita da GNR do Quartel do Carmo se coibiu de arengar às massas populares e convencê-las a abandonar o local… A populaça não lhe ligou a ponta dum corno!
(in Wikipedia)



Fausto Castelhano e o mecânico-escalador (e amigo) Manuel Silvestre juntos do Emissor do 1º Programa da RTP do Centro Emissor de Monsanto - 15 de Janeiro de 1972.
(Foto de Fausto Castelhano)



Alvoroçado, saltei da cama, vesti-me num rufo, disse à minha mulher que ia dar uma saltada a Monsanto, despedi-me apressadamente e, quanto às miúdas (a Leninha, de oito anos e a Paulinha com 7 anos) nem isso… No bucho, não entrou côdea… Queria lá saber!
Desarvorei porta fora… Sentei-me ao volante do Vauxhall-Viva vermelho e… arranquei “na brasa”… Àquela hora da madrugada, o sossego reinava nas ruas, trânsito diminuto ou inexistente… Apenas o ronronar do motor do carro… Buraca, Embaixada do México, Estádio do Casa Pia e, a partir daí internei-me, em cheio, na mata do Parque Florestal de Monsanto… A subida até ao cruzamento da Estrada do Forte de Monsanto, “Curva da Marreca”, Rotunda da Cruz das Oliveiras, subida pela Estrada Tenente Martins (na direcção da Cadeia de Monsanto) e, a meio do percurso e à direita, a Estrada da Belavista. A poucos metros, o portão do Quartel do GDACI (Grupo de Detecção Alerta e Conduta de Intercepção da Força Aérea Portuguesa) e o atento sentinela de G3 a tiracolo… Mais cinquenta metros adiante e confundindo-se no denso arvoredo do Parque Florestal de Monsanto, lá estava a elegante e inconfundível torre metálica (em aço alemão) que suporta os 12 painéis de emissão da RTP1 e os 64 painéis de emissão da RTP2 (e os respectivos cabos coaxiais) e, no cocuruto, os quatro farolins vermelhos de sinalização ao tráfego aéreo…
Como era costume, apliquei duas breves buzinadelas do claxon do carro e… pronto… Com a pedra no “chanato”, olho aberto e dedo no gatilho, parei frente ao portão do Centro Emissor de Monsanto. Aparentemente, estava tudo como dantes, Quartel-General em Abrantes…
Tinham transcorrido cerca de quinze intranquilos minutos desde casa (morava, ao tempo, na Rua Manuel Múrias, no Charquinho) até ao meu destino, mas sem motivo aparente, um sentimento de profunda insegurança e receio apossou-se do meu ser…



NOTAS


(3)


O rádio-transistor que me permitiu ouvir o 1º Comunicado do MFA

O receptor de rádio transistorizado (d’uma conhecida marca japonesa muito em voga naquele tempo) fora adquirido, à sorrelfa, aquando da minha permanência (três anos) na Força Aérea Portuguesa na especialidade de Electrónica. Após frequentar a Escola Militar de Electromecânica, fui colocado no Aeródromo Base Nº1, Figo Maduro-Portela, local onde o negócio do contrabando fervilhava em alta escala. O magnífico aparelho possuía uma excelente onda curta que me permitia captar, em perfeitas condições de recepção, as emissões da Rádio Portugal Livre, tanto da Argélia como da Roménia (aqui, na voz inconfundível de Aurélio Santos).
No Laboratório de Electrónica do Aeródromo Base nº1, as emissões referidas anteriormente, eram captadas através dos magníficos rádios a válvulas Hamarland da própria Força Aérea Portuguesa e sempre avidamente escutadas por uma assistência fiel, atenta e bastante interessada… Bons tempos!


(4)

O 1º comunicado do MFA

04:26 horas: Leitura do primeiro comunicado do MFA, pela voz do jornalista Joaquim Furtado, aos microfones do Rádio Clube Português:
“Aqui posto de comando do Movimento das Forças Armadas.
As Forças Armadas portuguesas apelam a todos os habitantes da cidade de Lisboa no sentido de recolherem a suas casas, nas quais se devem conservar com a máxima calma. Esperamos sinceramente que a gravidade da hora que vivemos não seja tristemente assinalada por qualquer acidente pessoal, para o que apelamos para o bom senso dos comandos das forças militarizadas, no sentido de serem evitados quaisquer confrontos com as Forças Armadas. Tal confronto, além de desnecessário, só poderá conduzir a sérios prejuízos individuais que enlutariam e criariam divisões entre os Portugueses, o que há que evitar a todo o custo. Não obstante a expressa preocupação de não fazer correr a mínima gota de sangue de qualquer português, apelamos para o espírito cívico e profissional da classe médica, esperando a sua acorrência aos hospitais, a fim de prestar a sua eventual colaboração, que se deseja, sinceramente, desnecessária”. (in WIKIPEDIA).

Os outros Comunicados do MFA: 04:45; 05:15; 07:30; 10:30; 11:45; 13:00; 14:30; 15:00; 17:30, etc.


(5)

16 de Março de 1974

Cerca das quatro horas da madrugada do dia 16 de Março de 1974, o Regimento de Infantaria 5, aquartelado nas Caldas da Rainha, deteve o comandante, o segundo comandante e três majores e iniciou uma marcha com uma coluna autotransportada de 200 militares comandada pelo capitão Piedade Faria a caminho de Lisboa, com a específica missão de ocupar o aeroporto de Lisboa.
O objectivo, segundo se constava, seria derrubar o Governo e desbravar caminho para a Democracia. No entanto, falharam os apoios previstos e a coluna militar acabou por não conseguir entrar na capital. Os cerca de 200 militares regressaram, então, às Caldas da Rainha onde acabaram por se render e feitos prisioneiros. Terminava assim a tentativa de golpe de estado que serviu de ensaio para o 25 de Abril.


(6)

As grandes dúvidas persistem… até hoje!

As dúvidas, que teimosamente faço questão em manter, avolumaram-se com as declarações inusitadas do capitão Ramos, já na madrugada do dia 26 de Abril e após a apresentação da Junta de Salvação Nacional (01:26 horas). À pergunta do jornalista “Quanto aos presos políticos, como é?”, a resposta foi rápida e concisa: “Só saem alguns”! (a gravação existe nos arquivos da RTP). Sabemos quem lá ficava… ou não? Talvez, os que mais lutaram e arriscaram desde o 28 de Maio de 1926. Os que mais se sacrificaram, os que pagaram com a própria vida pela coragem e capacidade de luta, sem desfalecimentos e na esperança de uma sociedade mais justa… Aqueles que nunca fecharam as portas ou se encolheram… Resolver esta escaldante e embaraçosa questão, tornou-se proeza de vulto…
O povo cercou as prisões de Caxias e de Peniche e exigiu que os encarcerados fossem libertados…Os presos, por sua vez, apresentaram um ultimato “do caraças”: ou “os soltavam a todos ou então, nenhum dos detidos sairia cá p’ra fora”!
Daí que, os 35 detidos de Peniche só fossem libertados às 23.30 horas do dia 26 de Abril mas, os 81 presos de Caxias, só conheceram a liberdade a 27 de Abril, à noite… E foi necessário que as Forças da Marinha de Guerra (em Peniche, liderados pelo comandante Carlos Machado dos Santos) irrompessem pelas prisões dentro e abrissem os portões de par em par… O resto… são balelas…
Quanto aos juízes dos Tribunais Plenários, que julgavam e condenavam os patriotas portugueses a penas de prisão pesadíssimas e a outras medidas de excepção, estamos conversados… Não lhes tocaram, nem sequer com uma simples palheirinha… E, no que diz respeito aos agentes das PIDE/DGS, aos directores do Campo de Concentração do Tarrafal e ao médico carniceiro Esmeraldo Pais Prata, “o Tralheira”, nem é bom falar… Quanto mais se mexe na trampa… mais mal ela cheira…
Já agora, um pormenor curioso… Nos momentos conturbados da nossa História, seja na crise de 1383/1385, 1 de Dezembro de 1640, 5 de Outubro de 1910 e outras, o povo foi sempre convocado p’ró meio da rua, participando e agindo como o indiscutível sujeito da História! Agora, no caso concreto do 25 de Abril de 1974, verificou-se uma diferença abismal: o “povo miúdo” tornava-se um empecilho a ter em conta e ordenavam-lhe, sem peias, que se mantivesse no cortiço, sossegado e… sem bulir…


(7)

Um Horário de Trabalho bastante bizarro…

Em 1969, e através duma petição, os técnicos dos Emissores exigiram um Horário de Trabalho Especial sob pena de não controlarem os emissores e, pela mesma ordem de razões, recusavam a reparação de possíveis avarias se, por acaso, ocorressem… Alegaram, e bem, que as condições de trabalho na Sala dos Emissores colocavam a sua saúde em permanente risco provocado, não só pelas radiações dos próprios emissores mas, também, pelo intenso ruído derivado da deficiente ventilação do emissor do 2º Programa (Canal 25 - Banda UHF) que, entretanto, entrara em funcionamento a 25 de Dezembro de 1968.



27 de Fevereiro de 1969. Petição exigindo a alteração de Horário de Trabalho. Dos quatro técnicos que compunham os dois turnos, houve um deles que se recusou a assinar o documento… Ele anda por aí… na nossa Freguesia de Benfica…
(Documento de Fausto Castelhano)



27 de Abril de 1970) - 1ª página do extenso relatório onde constavam as conclusões do LNEC (Laboratório Nacional de Engenharia Civil, da Fábrica Phillips (Eindhoven – Holanda) e do Serviço de Medicina do Trabalho (de 27 de Abril de 1970).
(Documento de Fausto Castelhano)



25 de Dezembro de 1968 – Entrada em funcionamento do Emissor de UHF (canal 25) do 2º Programa da RTP. A partir da esquerda: os técnicos Oliveiros Lopes Gervásio, Fausto Castelhano, Martinho Gama Dias e o contínuo/vigilante Aníbal Alves.
(Foto da Revista Nova Antena e incluída na reportagem efectuada no Centro Emissor de Monsanto)



25 de Dezembro de 1968 - Pormenor da sala dos Feixes Hertzianos com os equipamentos TM110 (os primeiros à esquerda).
(Foto retirada da Revista Nova Antena e incluída na reportagem efectuada no Centro Emissor de Monsanto)



Um dos técnicos recusou-se a colocar a sua assinatura no documento não obstante, levámos por diante as nossas pretensões…
Numa primeira investida, a exigência dos reclamantes foi linearmente recusada porém, a rebelião apenas tivera o seu início… Chutámos tudo p’rá barafunda e esticámos a corda ao limite do possível… Rapaziada com o sangue na guelra, um pouco “atravessada”, mas era assim… A nosso pedido, o Serviço de Medicina do Trabalho, chefiado pelo Dr. Ramos Assunção (já falecido), deslocou-se ao Centro Emissor de Monsanto e analisou, em pormenor, todo o cenário existente na Sala dos Emissores; o Laboratório Nacional de Energia Civil (LNEC) foi requisitado e procedeu a medidas de Rádio Frequência na própria Sala dos Emissores; enviada uma exposição à Fábrica Phillips, em Eindhoven (Holanda) no sentido de examinar as possíveis fugas de RF no emissor do 2º Programa (a resposta chegou a 7 de Julho de 1969) e outra ao Serviço de Higiene e Segurança.
O impasse manteve-se durante algum tempo contudo, aquando duma avaria no Emissor do 1º Programa (canal 7), onde os técnicos de serviço à emissão não teriam sido tão lestos quanto deviam ou podiam (se calhar, propositadamente), as entidades superiores da RTP, não lobrigaram outra alternativa consensual e... amocharam…
O presidente do Conselho de Administração, Dr. Ramiro Valadão, enviou uma nota, urgentíssima, ordenando que se alterassem, imediatamente, os horários dos quatro técnicos dos Emissores de Monsanto… E só a esses… E mais: Que a mesa de comando fosse imediatamente removida da Sala dos Emissores e instalada uma gaiola de Faraday e à prova de ruídos, de modo a proteger os técnicos de eventuais radiações. Finalmente, seria substituído o sistema de ventilação do emissor do 2º Programa… A guerra terminara com inteiro sucesso e, ao tempo, fora uma valente pedrada no charco…



25 de Dezembro de 1968 - Reportagem da Revista Nova Antena no Centro Emissor de Monsanto na inauguração das emissões regulares do 2ª Programa da RTP (Canal 25).
(Foto retirada da Revista Nova Antena e incluída na reportagem efectuada no Centro Emissor de Monsanto)



Elaborámos o seguinte esquema: Por cada turno, equipas de dois técnicos com o horário de trabalho das 11:00 às 23:00 horas e um intervalo de 1/2 hora para o almoço e, claro está, outra 1/2 hora para o jantar… E, como cereja em cima do bolo, ainda fomos agraciados com um atraente subsídio como prémio pela bizarria do tipo de horário… A lei não permitia horários tão insólitos… Assim, a partir daí, trabalhava-se dia sim, dia não… Uma maravilha… Pois bem, em virtude deste tipo de horário, não tive o ensejo de participar no inolvidável desfile, pleno de transbordante entusiasmo do povo de Lisboa que foi o 1º de Maio de 1974. Pelos mesmos motivos, acabei por ficar enredado nas ocasiões mais críticas que se viveram nos anos de 1974 e 1975, ou seja, no 28 de Setembro de 1974, 11 de Março de 1975 e 25 de Novembro de 1975… Não sei se foi um grande “galo”ou não, mas vivi, em grande estilo, precisamente nessas datas, momentos inesquecíveis…



Fausto Castelhano e Francisco Madeira Gomes na novel Mesa de Comando, no interior da nova estrutura isolada da Sala dos Emissores - Gaiola de Faraday.
(Foto de Fausto Castelhano – Maio de 1992)




Ali, no nosso local de trabalho, enfrentámos situações embaraçosas e de enorme dramatismo originadas pela conflituosa e confusa situação política que se vivia, então, no nosso país… Os militares aprenderam depressa: o Centro Emissor de Monsanto, afinal de contas, era o fulcro em torno do qual gravitava toda a engrenagem das emissões de televisão… Ficámos protegidos pelas tropas que se transferiram, com armas e bagagens, p´ró Centro Emissor de Monsanto… Um autêntico quartel!


*********************************
Continua…





4 comentários:

Alexa disse...

Mais um excelente capítulo destas suas vivências, Amigo Fausto... os meus sinceros parabéns (sobretudo pela extraordinária Luta levada a cabo pela melhoria dos vossos horários de trabalho!).

Fico, ansiosa, a aguardar pelas "cenas dos próximos capítulos" ;)

Abraço amigo

Fausto disse...

Olá Alexa

Os meus agradecimentos pelo seu gentil comentário.
Quanto a essas lutas que se travaram no Centro Emissor de Monsanto, não queira saber. Tenho em meu poder um conjunto de documentação que dava pano p'ra mangas. Raramente, tivemos o apoio doutros sectores da RTP e, mais tarde, da TDP e da PT.
Porém, não se julgue que esses conflitos se resumiam ao Centro Emissor de Monsanto. Na nossa freguesia de Benfica desenvolveram-se lutas renhidas em muitos locais e empresas. A freguesia de Benfica bem se pode orgulhar por tais acontecimentos verificados no seu espaço territorial.
Benfica não era nenhum local edílico como nos quer fazer crer um certo autor da nossa praça (e que bem conhecemos) mas que vivia numa redoma de onde obtinha uma visão estreitíssima do pulsar da população da nossa freguesia.

Fausto Castelhano

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Alexa disse...

Amigo Fausto: penso que é mesmo muito importante que se mencione esse outro lado da freguesia de Benfica, que, de tão romanceada, acabou por parecer idílica a umas quantas pessoas.

Muito obrigada pelo excelente trabalho de memória histórica que tem vindo a desenvolver neste blog, Fausto!

Abraço amigo